Ao clero de Osasco e às Coordenações de Pastoral, Coordenações da Pastoral Familiar, movimentos e associações, Leigos e leigas dispostos a dialogar com a sociedade sobre os Planos Municipais de Educação
Nosso fecundo diálogo entre a Igreja e a Sociedade, tematizado pela Campanha da Fraternidade de 2015, expresso em muitos encontros das nossas lideranças com os poderes públicos, deve continuar permanentemente, sempre respeitados os limites da justa laicidade por parte do Estado e a liberdade de as Igrejas mostrarem integralmente os seus pontos de vista, tendo em conta a sua missão de apresentar o Evangelho como base de um humanismo sadio para toda a sociedade.
No campo da Educação e da Cultura, particularmente, a nossa Igreja sempre esteve presente, antes ainda que o Estado pudesse oferecer um ensino de qualidade e a formação ética e humana necessária para o desenvolvimento das pessoas. É nesse campo e, especialmente, na questão do ensino público, que eu gostaria de refletir com as nossas lideranças católicas, com vistas a um diálogo com o legislativo e executivo dos municípios em que atuamos, no momento em que os municípios estão escolhendo caminhos para a ensino público, através dos Planos Municipais de Educação.
Participação ampla – Coloco num primeiro anexo a carta assinada pelo Secretário Geral da CNBB, Dom Leonardo Steiner, que alerta a nós todos quanto ao acompanhamento desses planos que podem ser aprovados em prazo muito curto, sem muita participação da sociedade. E envolve questões importantes como o investimento que deverá ser feito pelo município, a capacitação dos docentes e a infraestrutura de cada escola. Mas é, sobretudo, a inclusão da chamada “ideologia de gênero” que nos chama a atenção na proposta do Conselho Nacional de Educação, que precisa ser conhecida e questionada pela sociedade.
É bom notar que essa ideologia resulta em políticas públicas que geram uma mudança de concepção do ser humano, e uma mudança de comportamentos, no âmbito da identidade da pessoa e da sexualidade, cujas consequências são inimagináveis. Não se trata, pois, de uma questão de doutrina religiosa ou de direitos individuais que, aliás, devem ser respeitados, mas de um processo destrutivo da própria base da natureza humana e que, por isso, diz respeito ao bem de toda a humanidade, e não apenas da religião.
Mudanças assim não podem acontecer sem ampla discussão onde estejam envolvidos não apenas os legisladores, mas também os educadores, e sobretudo as famílias que, antes do próprio Estado, são as primeiras responsáveis pela educação das novas gerações. Sugiro a leitura do segundo texto anexo, do nosso Padre Doutor José Eduardo Oliveira e Silva, que aprofunda a questão da ideologia de gênero que, só para lembrar, foi excluída pelo Legislativo Federal na votação do Plano Nacional de Educação, e agora volta a ser apresentada, sem tempo para ampla discussão, e orquestrada por grupos de ativistas, para ser incluída nos planos municipais.
A “ideologia de gênero” não se apresenta com esse nome, pois ideologia aqui tem um sentido bem negativo: não é um simples conjunto de ideias, mas uma formulação doutrinária feita para persuadir e forçar sua implantação sem que as pessoas envolvidas possam reagir com consciência a isso que as agride. No caso, começa-se a perceber sua incidência no uso de determinadas palavras, por exemplo: em vez de sexo masculino e feminino se usa “gênero” masculino e feminino.
Em vez de pais e mães, se usa “cuidadores”, em vez de paternidade e maternidade, se usa “parentalidade”, no lugar de homossexualidade diz-se “homoafetividade”, e assim por diante.
Esta troca de palavras não é nem um pouco inocente. Ela quer ressaltar que a diferença dos sexos não está na base biológica, na natureza, mas é uma questão apenas cultural. Sendo assim, masculino e feminino não dependem do dado biológico, mas é uma construção cultural que, sendo independente da natureza, pode ser desconstruída e reconstruída de outra forma, ditada por impulsos, interesses ou preferências de cada indivíduo.
Esta ideologia destrói o conceito de família, se opõe à visão bíblico-cristã da pessoa e da sexualidade, institui um conceito de família não fundamentado na natureza, mas no laço efêmero do afeto, sem história e sem consequência. Novamente, o problema dessa posição ideológica não são os direitos dos homossexuais, independentemente de qualquer juízo moral. (eles também necessitam, em seu relacionamento ser homem-homem, mulher-mulher).
O problema está em destruir a identidade mais profunda da pessoa, seja qual for o seu comportamento. O problema está em negar que a diferença sexual, inscrita no corpo, possa ser indicativa da pessoa. Está em negar a complementariedade natural entre os sexos,
dissociando a sexualidade da procriação. O destrutivo está em considerar o ser humano como assexuado por natureza, e por isso manipulável ao sabor de interesses diversos, seja do mercado, do consumo ou da moda ou de grupos ideológicos.
No longo prazo, isso vai gerando a incapacidade de muitos de se situar e se definir naquilo que têm de mais elementar, sua natureza. Facilmente essa mudança de linguagem vai mostrando as suas consequências, seja na legislação (redefinição do casamento, adoção por parceiros do mesmo sexo, mudança de sexo, acesso a procriação artificial ou ventres de aluguel, e muito mais). Chega também essa ideologia ao âmbito da escola, através da educação sexual oferecida independentemente do critério das famílias e da religião. Assim as teses dessa ideologia são apresentadas como se fossem um dado científico indiscutível a assim ensinados.
Pior: por ser esse ideário um sinal de modernidade já difundido no exterior, seríamos um país atrasado se não pensássemos da mesma forma. Isso abre as portas para que pessoas menos avisadas aprovem essas ideias sem conhecer as consequências.
Não vamos ser ingênuos: há quem lucra muito com essa relativização dos costumes, com as mudanças de comportamento, com o consumo substitutivo dos verdadeiros valores, com as políticas geradas em torno da ideologia de gênero. E não são as famílias, nem aqueles que pensam estar seus direitos sendo protegidos, nem mesmo a sociedade que já contabiliza custos altíssimos com o cuidado de crianças que crescem sem amor, de idosos abandonados, de comportamentos anti-sociais e até criminosos, gerados pela solidão e pela ausência de berço e convivência familiar.
É bom notar que o debate, que está sendo realizado nos ambientes públicos, tem sido marcado pela presença de ativistas, convocados por redes sociais e dispostos ao confronto, ao modo dos “black blocs”. E é claro que esses confrontos os favorecem e lhes concedem grande visibilidade, muito a gosto da mídia, mas que não favorecem a serenidade do debate, pois não é esse o objetivo desses grupos. Fazer confronto diante das câmeras passa a impressão de campo de guerra, de batalha entre torcidas organizadas. Não aparece ali o fato de que a imensa maioria do país é feita de famílias que prezam os princípios da fé e os princípios sólidos sobre os quais se assenta a vida humana. Por isso, entendo que a mobilização das famílias deva ser muito mais de corpo a corpo, pessoalmente, com os legisladores, com os educadores, com os grupos de pastoral, numa ação urgente, porém permanente e
expressiva.
expressiva.
Assim como aconteceu no âmbito federal, em que os legisladores não cederam ao coro dos ativistas, mas retiraram do Plano Nacional as referências à ideologia de gênero, assim devemos agir, com a mesma consciência, ao acompanhar a votação dos Planos Municipais. Importante é reforçar que é da família o direito de educar. Uma Pátria Educadora não pode ser entendida como um impedimento para que as famílias sejam educadoras.
Convido-os a ler aprofundar essa questão, antes que seja tarde, se já não for tarde demais. Alertar e ilustrar a nossa consciência é uma vantagem, mesmo porque as leis, inclusive as que já foram aprovadas, se desfavoráveis à família e à vida, podem ser novamente desaprovadas. Em tempos de grande destruição da natureza, revogar as leis que permitem destruí-la é um avanço. Mais ainda quando se trata de destruir a natureza humana, a ecologia humana, que o Papa Francisco trata em nova encíclica, que une a natureza e o ser humano.
Os Planos Municipais de Educação estão a ser votados. Há itens que ferem não só o nosso patrimônio religioso, mas a visão mais sólida do ser humano, milenarmente cultivada e seguida, e para qual o humanismo cristão muito contribuiu. A defesa de um modelo de família e de sexualidade que a sabedoria da humanidade cultivou será um benefício para as gerações futuras. Não podemos tratar disso às pressas e sem responsabilidade.
Num momento importante como este, e em assuntos de tanta gravidade, nossa Igreja não pode
ausentar-se, nem podem as nossas famílias delegar ao Estado a função que lhes é própria, escolhendo e direcionando a educação de seus filhos para os valores mais sólidos.
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