19/11/2016

Quando começa a vida espiritual de alguém?

Saiba quando começa a vida espiritual de alguém

 

Quando começa a vida espiritual de alguém - 1600x1200 

Foto: Daniel Mafra/cancaonova.com


A dimensão espiritual começa a desenvolver-se quando emerge e se realiza uma nova consciência e um novo controle das próprias ações, ou na tomada de posse da própria realidade. É uma passagem notável, que vem em um determinado momento da historia humana, nas pessoas particulares, e representa a última etapa da maturidade.


É difícil determinar essas passagens, seja pela humanidade ou pelas pessoas individuais. Se a nossa humanidade está cerca de trezentos mil anos sobre a Terra, a dimensão espiritual é muito mais recente. A prática religiosa pertence agora ao âmbito psíquico e constituiu o ambiente no qual se desenvolveu a dimensão espiritual.


Essa emerge quando o homem toma consciência de ser inserido em um processo maior, de ser âmbito da manifestação de uma “energia” mais profunda, de uma realidade transcendente, e assume a postura correspondente, ou seja, a postura de acolhimento. Isso vale para todas as culturas e religiões. O homem espiritual afirma: “Não sou eu a pensar, mas é o pensamento que me faz exprimir-se; não sou eu a amar, mas é o bem que me faz transformar-me em amor. Não sou eu a querer, mas é a força da vida que em mim faz transformar o desejo e a ação”.


As experiências místicas das diversas religiões são as expressões de uma vida espiritual que atinge a maturidade.
As estruturas de comunicação comerciais, industriais e políticas requerem uma nova espiritualidade. A dificuldade que a humanidade, hoje, prova é que existem estruturas universais, mas não existem homens espirituais que saibam gerenciar essas estruturas. Estamos em retardo a respeito do caminho do desenvolvimento humano, da técnica e da ciência.


Hoje, existe uma forte exigência de espiritualidade, que não é exigência de prática religiosa. A prática religiosa é necessária, mas não é suficiente. Exige-se alguma coisa maior: entrar em sintonia com a força criadora que requer uma postura nova. Estamos diante de uma realização da história humana, que requer novidade psíquica e espiritual. Umberto Galibert sustenta que, hoje, o homem é inadequado a viver a estação histórica, porque não é capaz de prever as consequências de suas ações. “É essa capacidade que o homem de hoje tem de menos, não é mais capaz de antecipar, nem mesmo de imaginar os efeitos últimos do seu fazer.


Nessa inadequação, o seu risco máximo, assim como na ampliação da sua capacidade de compreensão do desmedido que o circunda, a sua flexível esperança” (Livro: Psique e Techne, Feltrinelli, Milano, 1999).


Por isso, ele sustenta a necessidade de um suplemento psíquico. Cremos que todos estamos de acordo sobre esse ponto, precisando talvez que o suplemento psíquico seja de natureza espiritual. Ocorre assim um suplemento de espiritualidade. A espiritualidade, ou seja, as posturas que correspondem ao emergir da dimensão espiritual do homem, do qual hoje tem necessidade, é uma espiritualidade da relação. Vale dizer a passagem da espiritualidade do ser para a espiritualidade da relação. Nós não somos, mas nos tornamos; somos, mas o nosso ser é continuamente feito pela relação, porque antes de mim estão os outros, dos quais venho. Essa é a dimensão espiritual da pessoa.


Uma parábola de Jesus, do Evangelho de Lucas, exprime em modo plástico a diferença entre o homem psíquico e o homem espiritual e entre as duas correspondentes espiritualidade: a parábola do fariseu e do publicano que sobem ao Templo para rezar (Lc 18,9-14). O fariseu agradece a Deus pela sua bondade, que ele pode se vangloriar: observa a lei, paga o dízimo, é fiel com a esposa, realiza a justiça. Porém, torna a casa não justificado, ou seja, não em justa relação com Deus. A razão está no fato que ele está centralizado em si mesmo. Pensa de ser princípio do bem aquilo que cumpre por norma: paga as taxas e faz os jejuns.


O homem espiritual, ao contrário, é consciente de não ser ele o princípio da sua perfeição e da sua ação. Como Jesus que repreende o notável que o interpela com a fórmula “bom mestre”. Jesus o repreende dizendo: “Por que dizes bom mestre? Ninguém é bom a não ser um só: Deus” (Lc 18,19). O publicano, ao contrário, assume uma postura de escuta e acolhimento: “tende piedade de mim pecador”. Por isso, “voltou para casa justificado” (Lc 18,14).


São Paulo, da sua parte, utiliza três modelos diversos. Distingue o homem velho e o homem novo; o homem exterior e o homem interior; o homem psíquico e o homem espiritual. As três fórmulas têm referências culturais diversas, mas, na prática, podem coincidir. Hoje, prefere-se utilizar a terceira fórmula para indicar o caminho da maturidade humana.




Autora: Fernanda Soares Zapparoli
Fonte: Canção Nova

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