26/01/2010

A Juventude e o desafio de uma nova evangelização


Dom Antônio Carlos Altiere


"Precisamos trabalhar muito para que a juventude seja conscientizada e preparada para esta reação e para fazer melhor"

“Estamos vivendo não só uma época de mudanças, mas uma mudança de época”. É o que diz Documento de Aparecida sobre a atualidade e os desafios da Igreja num mundo tão marcado pelo secularismo e pela técnica. Neste mesmo contexto está a juventude e o desafio de uma nova evangelização, a qual, segundo Dom Altiere, precisa: “Compreender a sua linguagem, para sentir o que eles sentem e, portanto, responder àquilo que eles precisam”.


Nesta entrevista, Dom Antônio Carlos Altiere, Bispo de Caraguatatuba (SP), nos fala dos desafios na evangelização da juventude atual, assim como o compromisso do jovem para uma sociedade mais justa e fraterna e da alegria de pertencer a Cristo deixando de lado as coisas passageiras e assumindo a alegria que não passa.


Cancaonova.com: Dom Altiere, a Congregação Salesiana surgiu da necessidade do acolhimento e da catequese dos jovens da periferia de Turim. Este era um grande desafio para Dom Bosco em sua época. Quais os grandes desafios na evangelização da juventude de hoje?


Dom Altiere: Dom Bosco, pela realidade onde viveu e pela sua tenacidade, conseguiu com seu carisma resolver o problema do jovem carente da sua região naquela época. Nós falamos da época da Revolução Industrial, de jovens marginalizados e explorados. Mas, infelizmente, a coisa no mundo se multiplicou, e nós [salesianos] não somos suficientes depois de 150 anos. Estamos presentes no mundo inteiro, mas não em número suficiente. Nós precisamos, então, ser multiplicadores. Eu me lembro de que Dom Luciano Mendes, quando era Bispo auxiliar de São Paulo, nos disse, numa palestra emblemática sobre o carisma salesiano: “Salesianos, ensinem-nos a fazer o oratório”, que é tocar o coração da juventude, porque Dom Bosco sabia que, se conseguíssemos ganhar o afeto do jovem e seu coração tudo o mais estava ganho. E, infelizmente, os ídolos hoje chegam antes da proposta de Jesus e nós pessoas de igreja e de fé não temos a suficiente pedagogia ou “santidade” para gostarmos do que o jovem gosta, para termos paciência de compreender a sua linguagem, para sentir o que eles sentem e, portanto, responder àquilo que eles precisam e não a perguntas que eles ainda não fizeram.


Cancaonova.com: Estamos nos aproximando do carnaval e muitos jovens acreditam que não é possível ser alegre e descontraído num ambiente de igreja. O que o senhor diz sobre isso?

Dom Altiere: Isso é um grande engano. Porque a alegria do carnaval é externa, é favorecida pelas estruturas e em três dias; ao passo que a alegria do jovem, do cristão é perene, é muito mais possível e válido lutar por essa alegria do que por aquela que passa e deixa consequências negativas e opostas para serem curtidas e consertadas logo depois. É possível ser alegre a vida toda e mesmo sendo jovem. Mas é possível também intensificar em alguns momentos, festejar, porque toda festa é uma saída da rotina, quando celebramos por exemplo o nosso aniversário ou o Dia das Mães, por exemplo. Eu até vejo o carnaval como três dias emblemáticos da alegria, mas pode ser de uma alegria santa, uma alegria pura, uma alegria que vem e se concentra com a alegria vivida durante todo o ano. Então é falsa aquela alegria forjada por três dias, quando, na verdade, ela não representa a alegria vivida no dia a dia de uma pessoa.


Dom Altiere - Bispo de Caraguatatuba (SP)
Foto: Robson Ciqueira


Cancaonova.com: Dom Altiere, neste ano vamos ter eleições no Brasil. O que se espera de um jovem comprometido com o Evangelho neste ano de 2010?

Dom Altiere: De fato, a sociedade espera que as novas gerações reajam ao desmando e àquilo que não é positivo, assim como ao uso indevido do poder, daqueles que conseguem status de forma de governo e que acabam governando para si mesmos. O fato é que precisamos trabalhar muito para que a juventude seja conscientizada e preparada para esta reação e para fazer melhor, porque nós vemos muitas críticas até de pessoas mais jovens, mas que, no fundo, têm o coração imbuído da mesma ganância, do mesmo ídolo, que é o poder. E quando eles chegam lá esquecem as promessas fictícias que estavam acostumados a ouvir e que até criticavam para fazer o que lhes interessa pessoalmente. Então, é preciso, jovem ou menos jovem, estar conscientes de um serviço, de uma vocação e do compromisso com a sociedade e com os valores cristãos, os quais, justamente, renovam os conceitos de autoridade e poder, porque Jesus Senhor, Rei e Mestre, veio para servir e não para ser servido. E Cristo não só falou isso, mas lavou os pés dos discípulos para que eles fizessem o mesmo. Por isso, aquele que busca usar a autoridade que Deus lhe deu deve estar disposto ao serviço, principalmente por coerência e justiça. Mas este mecanismo é um trabalho de toda a comunidade, da Igreja e da sociedade.


Cancaonova.com: O senhor poderia deixar uma mensagem à juventude do Brasil que nos acompanha pelo Portal Canção Nova?

Dom Altiere: Eu posso até repetir aquilo que Bento XVI – com o qual eu tive a oportunidade de estar no mês passado – vinha dizendo, que ele se via preocupado com o Brasil, o maior país católico do mundo, mas que tinha muita divisão de seitas, muitos desânimos. Mas quando ele veio ao Brasil pôde constatar o número de grupos de pessoas e de jovens, de novas comunidades, que se consagram em vista da missão. Ele disse que se surgem seitas, surgem também novas comunidades como cogumelos. Então, se é preocupante que algumas árvores frondosas caiam, eu acho que também devemos estar conscientes de que a nossa selva gigantesca – não só a Amazônia, mas a nossa população católica, que cresce muito mais serena à sombra destas novas comunidades que crescem e que usam dos meios de comunicação, assim como vocês [Canção Nova]) –, sem dúvida, se multiplicará.

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